

A antiga expressão “não ter onde cair morto” se encaixa perfeitamente na situação vivida pelos moradores de Baixa do Meio, distrito de Guamaré. O Cemitério Público local está há anos com a capacidade esgotada, sem qualquer espaço disponível para novos sepultamentos. A cena é de completo abandono e desespero para quem, além da dor da perda, enfrenta a falta de dignidade até na hora do último adeus.
Segundo o morador, comerciante e professor Paulo Cavalcante, mais conhecido por “Professor Paulo”, a realidade é alarmante: “Se uma família quiser sepultar seu parente aqui, só se for em pé, porque não há mais espaço”, desabafou.
Uma dor que vai além da perda
Perder alguém querido já é, por si só, um momento devastador. Mas em Baixa do Meio, o sofrimento é agravado por uma dura constatação: não há onde enterrar os mortos. A ausência de vagas no cemitério público transformou o luto em uma peregrinação angustiante.
Essa situação, que se repete ano após ano, expõe um problema estrutural que parece não ter fim. Não é diferente na sede do município, onde o Cemitério Público de Guamaré enfrenta a mesma realidade. A obra do novo cemitério, que deveria amenizar o problema, encontra-se paralisada há quase 90 dias por falta de pagamento, segundo informações apuradas no local.
Filha implora para sepultar sua mãe
Nesta semana, mais um episódio doloroso escancarou a gravidade da situação. Após o falecimento de uma idosa, a filha da falecida enfrentou o desespero de não encontrar local para o sepultamento da mãe. Segundo relatos, a mulher teria morrido em consequência de negligência médica, o que aumentou a comoção popular e a revolta entre os moradores.
“É uma crueldade exigir que alguém tenha de planejar a morte, quando muitos mal conseguem garantir dignidade em vida”, lamentou um familiar, em tom de desabafo.
Uma repetição que virou rotina
O drama dos cemitérios superlotados em Guamaré e Baixa do Meio já não é novidade. Há anos o problema é conhecido, debatido e prometido ser resolvido, mas continua sem solução. Enquanto isso, o tempo passa, a cidade cresce, e com ela, inevitavelmente, o número de óbitos aumenta.
O que não cresce, no entanto, é o planejamento público e o respeito à dor alheia. A morte, embora inevitável, segue sendo tratada como um tema secundário, invisível aos olhos do poder público.
A morte como parte da cidade
Planejar o futuro de uma cidade também significa planejar o seu espaço para os mortos. Ignorar isso é ignorar a dignidade humana em seu último momento. A falta de estrutura e de políticas públicas eficazes no setor funerário é um reflexo claro da negligência institucional que atinge os vivos, e agora, também, os mortos.
Em Baixa do Meio, a realidade é tão absurda quanto cruel: até para morrer, é preciso ter sorte.
NOTA DO BLOG
A fala do comerciante e professor Paulo Cavalcante resume o tamanho do descaso: “Se precisar sepultar alguém no cemitério de Baixa do Meio, só se for em pé.”
A frase, que soa como uma metáfora da falta de gestão pública, traduz uma verdade amarga. Quando a população chega ao ponto de precisar improvisar até o descanso final, é sinal de que a dignidade humana já foi enterrada há muito tempo, esta, sim, sem direito a sepultura.
Enquanto o poder público fecha os olhos, a morte continua batendo à porta e nem espaço para ela resta.
